O processo de Recuperação Judicial, ou RJ, como se costuma falar, veio à tona recentemente com a crise nas Americanas (AMER3), e o desenrolar já há alguns anos de outras empresas famosas da bolsa de valores, como a Oi (OIBR3). A RJ é uma medida extrema, que a empresa toma para evitar a falência, mas que muitas vezes acaba sendo a saída encontrada para situações adversas nas grandes empresas. Mas o que é que e como funciona um processo de recuperação judicial?
Em primeiro lugar, é importante diferenciar a RJ e a falência. Se uma empresa precisa optar por uma dessas alternativas, é porque ela possui dívidas e obrigações com valores e prazos que não possui mais condições de honrar. A falência implica na empresa fechar as portas, encerrar todas as operações, e vender os ativos que possui para pagar a totalidade ou parte dessas dívidas. Já a RJ permite que a empresa continue com suas operações, mas serve para viabilizar um acordo entre a empresa e seus credores.
No caso de falência, os sócios perdem o seu equity, fornecedores perdem seu cliente, clientes perdem um produto/serviço, funcionários perdem seus empregos, o governo arrecada menos impostos e credores não recebem o pagamento de seus empréstimos. No cenário ideal da recuperação judicial, todos esses stakeholders tendem a sair do processo em uma situação melhor do que na falência, e a empresa pode inclusive, após se reestabelecer e pagar o que deve, voltar a ser um negócio saudável e lucrativo. Para isso que fosse possível, foi criada a lei 11.101/2005, conhecida como Lei de Recuperação Empresas e Falência.
A RJ só pode ser pedida pela própria empresa devedora, e há diversos critérios de elegibilidade, como não ter sócios condenados por crimes previstos na lei falimentar, e não ter participado de outra RJ nos últimos 5 anos. Para iniciar o processo, a empresa deve elaborar um documento com o pedido e entrega-lo à Justiça, indicando os motivos da crise, demonstrações contábeis dos últimos 3 anos, dívidas da empresa e relação patrimonial dos sócios.
Se o juiz aceitar o pedido, é estabelecido um prazo de 180 dias para a suspensão das obrigações de pagamento da empresa, ou seja, nesse período a empresa não precisa efetuar pagamentos relativos à dívidas. O juiz nomeia também um administrador, que irá supervisionar o processo e auxiliar seu andamento. Após 60 dias do início, a empresa deve apresentar um plano detalhado de pagamento das dívidas – que pode envolver diversas ações, como venda de ativos, fusões, demissões – que será negociado com os credores. É necessário a aprovação por parte de pelo menos 50% mais 1 dos credores, do contrário eles que agora terão 30 dias para apresentar uma nova proposta, que também será votada.
Com a aprovação, começa a execução do plano. A empresa precisa cumprir ao longo dessa fase o que foi decidido no plano, e se não o fizer pode ter a RJ convertida em falência. Se for dando certo, a empresa vai aos poucos quitando suas dívidas, e se reestruturando. A ordem de pagamento se inicia pelas dívidas trabalhistas, depois créditos com garantia real (como imóveis), créditos tributários e depois demais créditos. Dessa forma, fornecedores e instituições financeiras acabam ficando mais para o fim da fila, e são muitas vezes os que possuem os maiores valores a receber.
Em 2021, passou a vigorar a lei 14.112/2020, que oficializou entendimentos prévios de tribunais e incluiu novos dispositivos na RJ, como empréstimos especiais, tutela cautelar antes da RJ e conversão de dívida em capital.
A RJ é um processo desagradável, e muitas vezes dolorido não só para a empresas, mas para todos os stakeholders. Porém, pode ter um resultado muito mais favorável que uma falência, permitindo que grandes negócios possam se recuperar e voltar a gerar riqueza para a sociedade. Para o investidor, é importante entender ao menos do que se trata, para que ele possa tomar decisões mais assertivas no caso de ter de decidir se vai comprar participação em uma empresa que está em RJ , por exemplo, ou então se deve deixar de ser sócio de uma empresa que acabou de dar pedido no processo.
Esse texto foi publicado pelo blog CDI – Conselho dos Investidores. Caso tenha interesse em aprender mais sobre investimentos, falar sobre o mercado, e investir melhor, entre em contato com a gente através do nosso Instagram @conselhodosinvestidores, ou pelo nosso site.